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Militares usam só dois helicópteros em apoio a TI Yanomami, alertam defensores públicos

‘É uma situação de guerra verdadeiramente’, adverte defensor público, que pede ‘toda a estrutura logística possível’

Publicada em 01/02/23 às 07:48h - 29 visualizações

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Militares usam só dois helicópteros em apoio a TI Yanomami, alertam defensores públicos
 (Foto: Rádio Rir Brasil - Brasília - Direção: Ronaldo Castro 61 99808 5827)

‘É uma situação de guerra verdadeiramente’, adverte defensor público, que pede ‘toda a estrutura logística possível’

Por Rubens Valente – Agência Pública

Apenas dois helicópteros das Forças Armadas estão dando apoio logístico aos servidores da Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas) e da Sesai (Secretaria Especial de Saúde Indígena) dentro da Terra Indígena Yanomami, em Roraima, no enfrentamento da crise sanitária que estourou no território durante o governo de Jair Bolsonaro e que foi descortinada nos primeiros dias do governo Lula. É o que revela um ofício enviado em caráter de urgência nesta segunda-feira (30) por um grupo de cinco defensoras e defensores públicos federais da DPU (Defensoria Pública da União) aos ministros da Defesa, José Múcio, e da Justiça, Flávio Dino.

Os helicópteros são necessários em bom número, conforme frisaram os defensores, a fim de garantir o transporte de remédios, alimentos e equipes de saúde e para que se consiga fazer uma grande busca ativa de casos de desnutrição, malária e outras doenças em toda a terra indígena. São mais de 300 aldeias, algumas localizadas a muitas horas de voo de Boa Vista (RR). Segundo a DPU, cerca de “98%” das comunidades Yanomami necessitam de transporte aéreo. Além disso, a pista de pouso do 5º PEF (Pelotão Especial de Fronteira) do Exército em Auaris, um ponto estratégico dentro do território indígena, a 445 km de Boa Vista, “não está em condições de utilização para aeronave de grande porte, o que dificulta a logística”.

“É urgente a manutenção da pista de pouso do 5º PEF para ampliar a logística na região. Também deve se destacar que o transporte aéreo mais efetivo para alcançar as diversas aldeias espalhadas pelos mais de 9 milhões de hectares são os helicópteros, todavia, só existem dois helicópteros das Forças Armadas atuando efetivamente na região da TIY [Terra Indígena Yanomami]”, advertiu o ofício da DPU.

“Diante deste cenário de guerra, para que o Estado brasileiro consiga garantir o direito à existência dos povos indígenas que vivem na Terra Indígena Yanomami será fundamental lançar mão de toda a estrutura logística possível, sem qualquer limitação orçamentária. É importante ressaltar que o principal meio de locomoção para conseguir chegar às aldeias dentro da TIY para levar alimentos, medicamentos e para tratamento médico é pela via aérea (realidade de 98% das comunidades). Assim, as Forças Armadas possuem um papel central na logística das operações”, advertiu a DPU.

Um dos subscritores do ofício, o defensor público federal Renan Vinicius Sotto Mayor de Oliveira, esteve na região na semana passada e constatou que “felizmente o Governo Federal tem tomado medidas para tentar melhorar a situação, mas a gente também percebe que, em relação principalmente à parte logística, ainda é insuficiente”.

“Principalmente o Ministério da Defesa precisa utilizar todas as aeronaves, equipes, principalmente a questão do meio aéreo, precisa ter toda uma mobilização para conseguir que a saúde e alimentação cheguem [aos indígenas], para que a gente não tenha mais indígenas Yanomami simplesmente morrendo de fome ou de consequências da malária. É uma situação de calamidade, de guerra verdadeiramente. Então a gente precisa que o Estado brasileiro – e aí pensando principalmente nas Forças Armadas — possam agir de forma efetiva para fazer chegar o socorro aos povos Yanomami e Yek’wana que vivem na região”, disse Oliveira à Agência Pública.

A DPU alerta desde 2020 o governo federal, na gestão de Bolsonaro, e organismos internacionais como a Comissão e a Corte de Direitos Humanos da OEA (Organização dos Estados Americanos) sobre a situação dramática dos Yanomami, alvo de intimidações, ataques e doenças trazidas pelo garimpo que mobiliza mais de 20 mil invasores, segundo as lideranças indígenas. O governo Bolsonaro nunca retirou os garimpeiros de forma maciça, agiu apenas pontualmente, com operações que não deram resultado a longo prazo. Com a presença garimpeira na terra indígena, os casos de malária explodiram.

“O que a gente percebe é que desde 2016 para cá, conforme até relatório do ISA [Instituto Socioambiental], ‘Yanomami Sob Ataque’ [publicado em abril de 2022], houve um aumento muito grande do garimpo ilegal e de toda a criminalidade envolvida. Toda essa situação [é] uma omissão estrutural do Estado brasileiro que a gente infelizmente… Políticas ambientais, a própria Funai desestruturada, as próprias falas do presidente da República incentivando o garimpo, inclusive pautando projetos de lei como o projeto que busca regularizar o garimpo em terra indígena, isso gerou um aumento gigantesco. E hoje o que a gente tem é uma situação de fome, miséria, malária, os povos indígenas sofrendo dramaticamente essa consequência”, afirmou Oliveira.

No documento enviado aos ministérios, os defensores reiteraram que “crianças estão passando fome e irão morrer a qualquer instante”. “Os relatos que chegam da TIY é que mães/pais buscam ajuda nos Polos-Base/Unidades Básicas de Saúde (UBS) mais próximas de suas aldeias e caminham por dias com fome e as crianças morrem em seus braços durante a caminhada, não dando tempo de buscar atendimento médico ou alimentação; há relatos de regiões de garimpo em que os criminosos não deixam os indígenas buscarem a alimentação distribuída e eles inclusive esconderiam as crianças desnutridas para não chamar mais atenção das autoridades”, denunciaram os defensores.

No ofício, a DPU solicitou que:

“a) seja determinado, de forma imediata, o envio de meios aéreos para distribuição das cestas básicas para a região de Auaris, de modo a serem atendidas as seguintes comunidades: i) kotaimatiu, ii) polapê e katanã, iii) Hokolaxi Mu, iv) õki ola; v) Xilipi e vi) Kuratanha e as comunidades que ficam no rio abaixo de Kuratanha, pois estão sofrendo grave situação de fome;”

“b) ampliem de forma imediata todo o apoio logístico, inclusive aumentando o número de helicópteros para atendimento na TIY, aumentando ainda mais o número de profissionais de saúde na região e que atuem de modo articulado com a Sesai e Funai, realizando busca ativa em todo o Território Yanomami para garantir que os povos indígenas que vivem na TIY possam ter direito à alimentação, à saúde, ou seja, direito à própria existência;”

“c) garantam, considerando elevado nível de periculosidade na região, a segurança e integridade dos profissionais da Sesai e da Funai que atuam na Terra Indígena Yanomami bem como dos povos indígenas.”

Além de Renan Oliveira, subscrevem o ofício da DPU os defensores Ronaldo de Almeida Neto, assessor especial para Casos de Grande Impacto Social da DPU, André Carneiro Leão, Marina Mignot Rocha e Carolina Godoy Leite.

Procurado, o Ministério da Defesa disse que está “empenhando todos os seus esforços, por meio das Forças Armadas, na busca da solução ao problema que atinge o povo Yanomami. Nesse sentido, a Pasta continuará analisando e atendendo as demandas apresentadas pelos órgãos envolvidos.” O ministério da Justiça não respondeu até a publicação. Havendo respostas, este texto será atualizado.

Nesta segunda-feira, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se reuniu com diversas autoridades do governo, incluindo os ministros Dino e Múcio, a fim de discutir o plano de emergência sanitária e a invasão garimpeira na Terra Indígena Yanomami. O governo anunciou que mais de mil atendimentos emergenciais foram feitos no território indígena desde a posse de Lula, no dia 1º de janeiro. No dia 20, a tragédia humanitária entrou com força no noticiário no Brasil e de fora do país. Desde o dia 20, uma força-tarefa do Ministério da Saúde atua na região para enfrentar os casos de malária e desnutrição. Lula também determinou uma série de medidas para controle do espaço aéreo e dos rios da região para sufocar a atividade garimpeira que é ilegal e criminosa dentro do território indígena.

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